Nenhum
objeto, lugar, atividade ou pessoa neste mundo é capaz de nos trazer a
segurança que amiúde nelas buscamos. Durante toda a vida eu busquei segurança
nos objetos e na atividade profissional. Em lugares e pessoas nem tanto. Os lugares
me pareciam diferir em alguns aspectos, uns me agradavam mais que outros, mas
essencialmente não havia diferença entre eles, ao menos não para a minha busca
por segurança. As pessoas em geral não me pareciam confiáveis: sentia que cedo
ou tarde me deixariam na mão, como, de fato, por diversas vezes, aconteceu e
creio que continuará acontecendo. E não estou aqui falando de decepção com as
pessoas, porque, como frisei, eu já contava com a falta de apoio delas. Era total
desconfiança mesmo. «Melhor eu me virar sozinha» — pensava eu. E assim agia. E
agindo assim, maior era a insegurança. Eu tinha
que dar conta. Comecei a trabalhar muito cedo, aos 15 anos, quando
minha mãe me deu a notícia de que não poderia me matricular numa escola
particular no ano seguinte. O motivo da queda do padrão de vida da família —
que nunca foi dos melhores — foi a separação de meus pais e a mudança que minha
mãe, meus irmãos, minha avó materna e eu fizemos de Minas Gerais para o
Espírito Santo, onde minha mãe pensava reconstruir sua vida (meu pai então voltou
a morar com minha avó paterna, no Estado do Rio de Janeiro). Fiquei apavorada
com a ideia de fazer o segundo grau (hoje ensino médio) em uma escola pública.
Era década de 1980 e a situação da educação do Brasil conseguia ser pior do que
hoje. Havia estudado a vida toda em boas escolas particulares graças aos
sacrifícios dos meus pais, em especial, da minha mãe. Eu tinha que passar no vestibular e conseguir uma profissão que
pudesse me dar uma «melhor condição de vida». Foi-me ensinado que uma boa condição
de vida era conseguir um trabalho bem remunerado: eu poderia escolher qualquer
profissão, desde que pagassem bem. Se era mesmo isso que diziam, não saberia
dizer, mas era o que eu extraía das mensagens. E sabe o quê? Eu sempre tive «sorte».
Desde meu primeiro emprego, sempre consegui boas colocações. E com um detalhe especial:
os convites e propostas de trabalho sempre chegaram até mim, com esforço mínimo
de minha parte. Meu primeiro trabalho foi como auxiliar em uma biblioteca
particular de um advogado. Aos 17 anos, eu já era um prodígio na computação,
trabalhava fazendo cálculos de processos judiciais em planilhas eletrônicas e ganhava
dinheiro suficiente para custear meus estudos. Não havia mensalidade, apenas os
livros, xérox, passagem de ônibus e alimentação, pois na época eu cursava
Engenharia Elétrica na UFES. Um ano mais tarde eu faria novo vestibular e
ingressaria no curo de Direito também na Federal. Sobrava para ajudar minha mãe
a pagar o aluguel, gastar com bobagens de adolescentes e guardar uma parte. Uma
parte pequena, porque nunca fui boa com essa coisa de poupança. Aos 20 anos me
casei com o pai do meu filho. Ele na época tinha uma carreira muito bem
sucedida no mundo corporativo e ocupava um cargo de diretor no mesmo Banco comercial
onde eu era Caixa. Por causa do relacionamento, tive de deixar o emprego, mas
vinha a calhar já que meu foco era a carreira jurídica e não a bancária. Minha
mãe ficou tão satisfeita com este destino — foi dela que herdei a preocupação
com a segurança financeira — que, ignorando todos os sinais contrários, aprovou
essa precoce decisão de nos casarmos, após breves nove meses de namoro. Colei
grau aos 22 anos, grávida de 6 meses de meu filho. Logo consegui meu primeiro
trabalho como advogada corporativa em uma grande empresa transnacional. Lá estava
eu com meu lindo emprego, bom salário e benefícios. Um apartamento de revista e
carros. Mas não era suficiente. Depois de apenas três anos, pedi demissão.
Fiquei sentida com a saída, mas nas circunstâncias era o que tinha que ser. Não
me abalei. Como a Fênix, ressurgi das cinzas. Foi nesta ocasião que me separei
do pai do meu filho. Sem qualquer alteração no nível de (in)segurança (só
constataria isso anos depois), fui morar em um pequeno apartamento alugado com
meu filho e comecei a trabalhar em um escritório modesto, em bem pouco tempo me
destaquei. Deste, fui para outro bem melhor, onde ganhei muito dinheiro e com a
mesma força gastei. Vieram muitos objetos: cacarecos, viagens e carros. Buscava
ainda uma segurança na forma de um reconhecimento profissional, aliada a uma
gorda remuneração. Ficava constrangida quando encontrava colegas da faculdade
com uma condição melhor do que a minha. Minha carreira como advogada se
consolidou. Cinco anos mais tarde eu sairia de lá para retornar ao mundo
corporativo, tendo então trabalhado em outra grande empresa transnacional e nela
comido o pão que o diabo amassou, quanto ao aspecto humano, mas sendo muito bem
remunerada! Fui sumariamente demitida, após um período de um ano de assédio
moral. Foi aí que finalmente ocorreu o primeiro «click» que me levaria ao
estudo do Yoga e a muitas mudanças. Vieram um novo emprego na advocacia
corporativa e o ingresso no mestrado, com a facilidade que já me era familiar. Nesse
período, fiquei tão atarefada que acabei comprometendo a atenção ao meu filho. Ele
foi super companheiro e compreensivo comigo. Mas foi também nessa época que ele,
frágil, com seus 14 anos, tomou seu primeiro e homérico porre. Eu fiquei
arrasada. A constatação: não estava no controle. Tive medo. Novas reflexões
sobre a tal segurança, que eu nunca alcançava. Terminei o mestrado. Fui
demitida. Passei um ano e meio sem trabalho formal, vivendo de economias, e não
tinha energia para iniciar nada na área jurídica. Custei entender o que
acontecia: eu havia mudado. A bem sucedida carreira jurídica não me atraía mais
e, o que era pior, era só o que eu sabia fazer! E o constrangimento de me
sentir fracassada se fez presente. Consegui um cargo no serviço público com um
salário mediano, mas era muito tranquilo. Adorei! Depois de um tempo troquei
por um cargo em outro órgão, que pagava mais. Dessa vez, o motivo da mudança
não foi o salário. Troquei porque as condições que existiam no trabalho
anterior desapareceram com a mudança da diretoria. Por enquanto, continuo no
serviço público e estou contente de estar onde estou. Meu trabalho não tem
visibilidade e tampouco constitui uma carreira para se ascender, mas eu me
sinto profundamente abençoada de poder simplesmente trabalhar! Agora sem aquele
peso do «tenho que», tenho dado
conta de manter a minha família e passei a focar melhor os meus gastos: estamos
investindo no estudo de Vedanta e na construção de um espaço para aulas de Yoga
e terapias. A vida é simples, mas muito mais leve. Uma mudança de carreira vem
aí, mas ainda faltam alguns ajustes e alguns passos. Quer saber se me sinto
segura? Às vezes sim, às vezes não. E quando não, eu lembro que existe uma
ordem maior do que eu e rezo. Harih Om हरिः ओम्
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